Como pode caber tanto sonho em algo tão pequeno?

          Como pode doer algo que, na prática, nunca tive?

          Se despedir de um sonho sempre dói, seja ele grande ou pequeno.

          A dor não muda. Se despedir de um filho, mesmo que ele ainda não tivesse formas, cor ou cheiro dói muito. Pra mim, ele tinha. Eu imaginava um dia com os olhos verdes do pai, outro dia, com os meus olhos.

      Imaginava rodopiando livre e alegre se fosse uma menina, ou correndo a casa toda animado e serelepe se fosse um menino.

        Imaginava o meu parto, a amamentação, o sono, a rotina, o quartinho, quem cuidaria quando eu estivesse no trabalho e até como seria a personalidade.

       Ficava imaginando se ia gostar de Toy Story tanto quanto eu, só para cantarmos juntos “amigo estou aqui” antes de dormir. Eu imaginava como seria a dor, o cansaço, os palpites, a luta e as dificuldades de ser mãe em uma sociedade tão dura com mulheres-mães. Mas a minha vontade de ser mãe sempre foi bem maior do que o medo de tudo isso.

          Eu não tinha essa preocupação que todo mundo relata de: não saber se tem filho ou não porque gostaria de oferecer um mundo melhor. Na verdade sempre acreditei que as coisas seriam melhores com ele aqui.

         A dor física, que é imensa, não se compara a dor de deixar tudo para daqui uns meses ou anos. Até porque, nesse exato momento que escrevo, eu não tenho o desejo que venham outros filhos fortes e saudáveis. Hoje eu só queria ter o que se foi aqui, no meu ventre.

         Muitos me dizem: Deus sabe de todas as coisas. Eu sei que ele sabe, mas eu não. Hoje, eu só sei que dói.

         Texto de: @jeh_kafka